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O falecimento de um ente querido é algo de extrema tristeza para todos os integrantes da família, principalmente os herdeiros.

Além do luto, são muitas burocracias e documentos para correr atrás.

Você já se perguntou o que acontece com a aposentadoria da pessoa quando ela falece? Todos os herdeiros têm direito a esse valor?

É algo que parece muito básico, mas muita gente não sabe. E então, quer descobrir?

Fica aqui comigo que você entenderá:

1. Quem é considerado herdeiro?

O herdeiro, também conhecido como sucessor, é a pessoa que recebe o patrimônio deixado por alguém que morreu.

Essa é a definição básica de quem é o herdeiro.

Então, vamos imaginar uma família de 4 pessoas, sendo:

  • o pai;
  • a mãe;
  • dois filhos de 4 e 8 anos de idade.

Acontece que o pai se envolveu em um acidente de trânsito e acabou falecendo.

No caso, quem terá direito a tudo que o pai possui serão os herdeiros, como os filhos e a mãe, no exemplo citado.

Inicialmente, vale dizer que a parte da herança é regulada pelo Código Civil brasileiro (Lei 10.406/2002) a partir do art. 1.829.

Primeiramente, devo falar sobre a figura do herdeiro necessário.

Herdeiro necessário

O herdeiro necessário é aquele que, obrigatoriamente, receberá o que o falecido deixou, como imóveis, terrenos, carros, entre outros.

Isto é, este herdeiro receberá todo o patrimônio de quem morreu.

São considerados herdeiros necessários:

  • descendentes (filhos, netos, bisnetos…);
  • ascendentes (pais, avós e bisavós…);
  • cônjuge ou companheiro.

Cabe dizer que a situação de união estável (companheiro ou companheira) do falecido, embora não esteja presente no Código Civil, constitui herdeiro necessário por julgamento do Tema de Repercussão Geral 498 e 809 do Supremo Tribunal Federal.

Desta maneira, não há nenhum tipo de distinção entre cônjuges e companheiros a título de herdeiros necessários.

Voltando ao assunto: nem todos os parentes receberão o patrimônio do falecido.

Isso porque há uma ordem preferencial de recebimento do patrimônio do instituidor, igual acontece com a Pensão por Morte.

Por exemplo, caso o falecido tenha deixado filhos, serão eles que terão prioridade no recebimento dos bens, e não seus pais ou irmãos, por exemplo.

Nesse sentido, vale dizer que a herança será devida aos herdeiros necessários na seguinte ordem:

  • Classe 1: descendentes, e, dependendo do caso, o cônjuge/companheiro;
  • Classe 2: ascendentes e cônjuge/companheiro.

Descendentes

São os:

  • filhos;
  • netos;
  • bisnetos;
  • trinetos;
  • tataranetos.

Em regra, os filhos sempre receberão parte da herança.

Dividirá a herança com os filhos, o cônjuge/companheiro do falecido, exceto se o regime de bens escolhido pelo casal tenha sido a comunhão universal ou de separação obrigatória de bens.

No caso dos netos, bisnetos, trinetos e tataranetos, a herança pode ser deixada na forma de direito de representação.

Em linhas simples, significa que estes herdeiros necessários terão direito ao patrimônio do falecido quando seu pai ou mãe tiverem morrido antes do instituidor principal, e assim por diante.

Por exemplo: Paula tem duas filhas, Fernanda e Thais.

Fernanda (filha) morreu em 2019 e Paula (mãe), em 2022.

Como a Fernanda (filha) morreu antes de sua mãe, os filhos de Fernanda (netos de Paula), terão direito de representação de sua mãe e receberão parte da herança, e assim sucessivamente, quando estivermos falando de bisnetos, trinetos, etc.

Não existe limitação nesse direito de representação para os demais descendentes (netos, bisnetos, trinetos, tataranetos).

Isto é, o direito de representação sempre pode ser realizado quando os herdeiros necessários possuírem direito de receber o patrimônio do falecido.

Ascendentes e cônjuges/companheiros

Os pais terão direito à herança somente se o falecido não deixar qualquer tipo de descendentes.

Além disso, os cônjuges/companheiros terão que dividir os bens do falecido com os ascendentes, obrigatoriamente, independente do regime de bens do casal, se já não foram enquadrados na classe 1.

Cabe dizer que nesta classe, não há o direito de representação para os demais ascendentes.

Isto significa que, caso haja um ascendente mais próximo (avó, por exemplo), os demais ascendentes (bisavós, trisavós e tataravós) do falecido não terão direito à herança.

Herdeiros facultativos

Os herdeiros facultativos são os parentes colaterais de até 4º grau.

Estes só terão direito caso não existam os herdeiros citados anteriormente (herdeiros necessários).

Cito aqui, em ordem de importância, os principais colaterais:

  • irmãos;
  • sobrinhos;
  • tios;
  • primos.

Os mais próximos afastam os mais remotos, salvo o direito de representação concedido aos filhos de irmãos.

Por exemplo, se o falecido só possui 2 irmãos e 2 tios (sem descendentes, ascendentes e cônjuge), a herança vai, obrigatoriamente, para os 2 irmãos, afastando os 2 tios do direito de receber o patrimônio.

E se houver testamento, como fica a situação dos herdeiros?

Imagine que a pessoa morreu sem deixar nenhum tipo de testamento?

Simples, seguirá a ordem explicada no tópico anterior referente a 100% do valor do patrimônio do falecido.

Neste caso, os bens serão divididos de forma igual entre o número de herdeiros.

Agora, se houver testamento, a coisa muda de figura.

O falecido deverá dispor de pelo menos 50% de sua herança para os seus herdeiros necessários.

Os outros 50%, podem ser dispostos livremente, como, por exemplo, para os herdeiros facultativos, amigos, entre outros.

Caso não existam herdeiros, ou, caso existam, renunciem à herança, o patrimônio deixado pelo falecido irá para o município ou para o Distrito Federal.

Falei mais sobre isso aqui: Planejamento sucessório: O que é e Como Fazer.

Exemplo prático

Imagine a situação de uma mulher que faleceu. Sua família é composta por:

  • seu esposo, em casamento no regime de comunhão parcial de bens;
  • duas filhas;
  • irmão;
  • mãe e pai;
  • tio e tia.

Ela deixou testamento deixando 50% de seu patrimônio para a sua tia, que cuidou da falecida durante 15 anos de sua vida.

Isso é possível, pois, como disse, 50% do valor da herança pode ser cedida para herdeiros facultativos.

Os 50% restantes serão divididos entre o esposo e as filhas da falecida.

As filhas têm direito porque estão na classe 1. Isto é, tem prioridade imediata e são consideradas as primeiras na fila para o recebimento do patrimônio de sua mãe.

E o esposo também recebe, pois casou-se no regime de comunhão parcial de bens.

Portanto, a disposição da herança da mulher ficará assim:

  • 50% para a tia;
  • 16,66% para cada filha;
  • 16,66% para o esposo.

Os pais teriam direito a 50% da herança se ela não tivesse deixado filhos e esposo.

Já o irmão só teria direito à herança se ela não tivesse filhos, pais e esposo.

Por fim, o tio receberia metade do patrimônio da falecida se ela não tivesse mais os filhos, pais, esposo e irmão.

2. Herdeiros têm direito à aposentadoria do falecido?

Com a explicação, você deve ter ficado na dúvida de como fica a aposentadoria do falecido, não é mesmo?

Apesar de integrar o patrimônio econômico do falecido, o valor da aposentadoria do instituidor não irá para os herdeiros.

A exceção fica em conta de casos em que a pessoa está no meio do processo administrativo/judicial para conseguir sua aposentadoria e falece.

Para responder melhor isso, e não mudar tanto o foco deste conteúdo, deixo aqui um artigo em que eu respondo o que acontece quando o segurado morre no curso do seu pedido de aposentadoria.

Note que aqui estou falando da aposentadoria concedida pelo INSS, e não de investimentos como previdência privada ou complementar, ok?

Quando o segurado morre, imediatamente o pagamento do benefício é cessado, ou seja, deixa de ser pago.

Na verdade, o cartório que registrou o óbito do segurado deve enviar os comprovantes do falecimento para o INSS e, uma vez tornando-se oficial a morte do beneficiário, a aposentadoria deixa de ser paga.

Voltando ao assunto: como a aposentadoria é um direito personalíssimo, ou seja, é devido somente para uma pessoa em específico, o benefício não pode continuar sendo pago para os herdeiros.

Agora você deve estar se perguntando: então o benefício do segurado falecido é extinto para sempre?

Sim, pois ele é cessado com o óbito do instituidor.

Mas calma, sempre tem a luz no fim do túnel.

Pode ser que alguns herdeiros tenham direito à famosa Pensão por Morte, em conta do falecimento do segurado que recebia aposentadoria.

3. Pensão por Morte equivale à aposentadoria do falecido?

Sim, mas nem sempre será o mesmo valor da aposentadoria que o falecido recebia em vida.

A Pensão por Morte é a substituição do valor que o falecido recebia de aposentadoria (ou, caso não estivesse aposentado, do valor que teria direito caso fosse aposentado por invalidez) em prol de seus dependentes.

O valor que os dependentes vão receber mudou com a Reforma da Previdência. Vou falar disso mais para frente.

Antes, vou explicar quem tem direito a esse benefício.

Vou começar com um exemplo.

Imagine que uma mulher morava com seu marido e dois filhos menores.

Ela recebia sua aposentadoria normalmente até que faleceu em conta de um acidente.

Sua família poderá ter direito à pensão caso preencha os requisitos para o benefício.

Mas, aqui vai um alerta: o pagamento do benefício é garantido para os dependentes de forma similar ao que acontece com a herança.

Isto é, existe uma ordem de dependentes para o recebimento de Pensão por Morte, sendo elas:

  • classe 1: cônjuges, companheiros, filhos menores de 21 anos ou filhos inválidos/pessoas com deficiência de qualquer idade;
  • classe 2: pais do falecido;
  • classe 3: irmãos menores de 21 anos ou irmãos inválidos/pessoas com deficiência de qualquer idade.

Isso significa que, caso existam dependentes na classe 1, as classes 2 e 3 não terão direito à Pensão por Morte, e assim em diante.

Ou seja, a classe 3 só receberá este benefício previdenciário se não existirem dependentes na classe 1 e 2.

Perceba também que as classes 1 e 2 são praticamente idênticas aos herdeiros necessários, enquanto a 3 refere-se a um dos herdeiros facultativos.

Mas, não se confunda, uma pessoa herdeira necessária/facultativa nem sempre receberá a Pensão por Morte, exatamente por existirem diferenças na consideração de dependentes aptos a receber o benefício.

4. Requisitos para a Pensão por Morte

Para você solicitar a Pensão por Morte do INSS, você precisará:

  • comprovar a morte do segurado instituidor do benefício;
  • demonstrar a qualidade de segurado do instituidor do benefício;
  • demonstrar sua qualidade de dependente.

Vou falar sobre cada ponto:

Comprovar a morte do segurado instituidor do benefício

Este requisito é bem fácil de ser completado.

Basta anexar ao pedido de benefício a certidão de óbito ou sentença que decretou a morte presumida do segurado instituidor do benefício.

Demonstrar a qualidade de segurado do instituidor do benefício

Como estamos falando especificamente de uma pessoa que estava recebendo uma aposentadoria, automaticamente ele possui qualidade de segurado.

Portanto, minha dica é anexar o Extrato CNIS do falecido para comprovar que ele estava recebendo o benefício previdenciário antes de seu óbito.

Você pode conseguir isso através do portal Meu INSS, com o login e senha do falecido.

Se você não tem acesso ao login e a senha do falecido, pode entrar com seu acesso próprio no Meu INSS e buscar pelo serviço “Solicitar Encerramento do Benefício por óbito”.

Encerramento do Benefício por óbito

Também é possível fazer o requerimento por ligação, através do número 135.

Demonstrar sua qualidade de dependente

Essa pode ser a parte que mais dificulta o recebimento de sua Pensão por Morte, principalmente se você for dependente da classe 2 ou 3.

Porém, vamos primeiro falar da classe 1.

Como este grupo de dependentes possui um grau de parentesco mais próximo do falecido, a lei previdenciária garante que a dependência econômica com o instituidor seja presumida.

Isto é, você não precisa comprovar que dependia economicamente da aposentadoria do falecido para sobreviver.

Portanto, para a classe 1, basta apresentar documentos que comprovem seu vínculo com o falecido:

  • para cônjuge/companheiro: comprovar casamento ou união estável anterior à data em que o segurado faleceu.
    • para cônjuge, basta apresentar certidão de casamento;
    • para companheiro, você pode apresentar contrato de união estável ou os documentos que citarei abaixo para a comprovação de dependência econômica.
  • para filhos: RG e certidão de nascimento.

Agora, as classes 2 e 3 precisam, obrigatoriamente, comprovar dependência econômica com o segurado falecido.

Por muitas vezes, os pais, em conta da idade avançada, necessitam de seus filhos para prover a sobrevivência digna do núcleo familiar, o mesmo podendo acontecer com os irmãos do falecido.

Listo aqui alguns documentos essenciais para a comprovação da dependência econômica.

Eles também são válidos para quem tem união estável, mas não possui o contrato.

Vamos lá:

  • certidão de nascimento de filho havido em comum;
  • certidão de casamento Religioso;
  • declaração do imposto de renda do segurado, em que conste o interessado como dependente;
  • disposições testamentárias;
  • declaração especial feita perante tabelião (escritura pública declaratória de dependência econômica);
  • prova de mesmo domicílio;
  • prova de encargos domésticos evidentes e existência de sociedade ou comunhão nos atos da vida civil;
  • procuração ou fiança reciprocamente outorgada;
  • conta bancária conjunta;
  • registro em associação de qualquer natureza onde conste o interessado como dependente do segurado;
  • anotação constante de ficha ou Livro de Registro de empregados;
  • apólice de seguro da qual conste o segurado como instituidor do seguro e a pessoa interessada como sua beneficiária;
  • ficha de tratamento em instituição de assistência médica da qual conste o segurado como responsável;
  • escritura de compra e venda de imóvel pelo segurado em nome do dependente;
  • declaração de não emancipação do dependente menor de 21 anos;
  • quaisquer outros documentos que possam ajudar a comprovar a dependência.

5. Valor da Pensão por Morte para os dependentes

Agora que você já sabe se tem direito à Pensão por Morte, vou te explicar como funciona o cálculo do benefício.

Este cálculo dependerá diretamente de quando ocorreu o óbito do instituidor ou quando foi feito o requerimento administrativo do benefício.

Para quem faleceu ou quem entrou com o requerimento administrativo antes de 13/11/2019

Neste caso, são aplicadas as regras anteriores à Reforma da Previdência, em vigor desde o dia 13/11/2019.

Neste caso, o valor a ser recebido pelos dependentes é 100% da quantia da aposentadoria recebida em vida pelo falecido.

Isto é, os dependentes dividirão igualmente tudo o que o instituidor recebia antes de seu óbito.

Vamos imaginar que um segurado deixou sua esposa e um filho de 3 anos, recebendo R$ 3.000,00 por mês.

Cada dependente receberá R$ 1.500,00 por mês, totalizando os mesmos R$ 3.000,00 recebidos pelo segurado em vida.

Para quem faleceu ou quem entrou com o requerimento administrativo (depois de ter passado 180 ou 90 dias do óbito do segurado) a partir de 13/11/2019

Neste caso, aplica-se a nova regra de cálculo que a Reforma da Previdência instituiu.

Ela funciona da seguinte maneira:

  • você pega o valor que o segurado recebia de aposentadoria;
  • deste valor, a Pensão por Morte terá o valor de 50% + 10% para cada dependente.

Você vai entender melhor esse cálculo com a tabela e o exemplo abaixo:

Quantidade de DependentesPorcentagem que os dependentes terão direito
160%
270%
380%
490%
5100% (limite)
6100%
100%

Então, seguindo o mesmo número de dependentes e valor de aposentadoria do exemplo passado: uma família com 2 dependentes e uma aposentadoria deixada de R$ 3.000,00.

A mãe e a filha terão direito a 70% do valor que o segurado recebia em vida, isto é, R$ 2.100,00 no total.

Isso significa uma Pensão por Morte de R$ 1.050,00 para cada dependente.

A diferença no valor nas duas regras é absurda, pois foi perdido R$ 900,00 no valor total do benefício.

Em 5 anos, o prejuízo seria em torno dos R$ 54.000,00.

Complicado o que a Reforma fez com a gente…

Pelo menos você já está ciente do valor que pode chegar a receber e se preparar financeiramente.

Conclusão

Agora você deve ter entendido que os herdeiros não terão direito aos valores de aposentadoria do INSS.

Porém, o que alguns deles têm a chance de conseguir é a Pensão por Morte, que substitui o benefício previdenciário recebido em vida pelo falecido.

Lembre-se que não são todos os herdeiros que possuirão esta chance. Portanto, veja bem os requisitos para não se surpreender caso o INSS te dê uma resposta negativa.

Além disso, você teve uma noção de quem são os herdeiros necessários e facultativos, e o que ocorre com os bens no processo tradicional e quando há testamento.

Nas próximas semanas, escreverei conteúdos sobre as modalidades de Planejamento Sucessório, e, entre elas, está o próprio testamento.

Muito obrigado por ter me acompanhado até aqui.

Um abraço e até a próxima 🙂

ben-hur-cuesta

OAB/PR 92.875
Advogado-Pesquisador em Direito Previdenciário e Mestre em Direito Internacional e Europeu. Apaixonado por Música Popular Brasileira e um bom açaí na tigela.