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Muitos não sabem, mas existe um Acordo Internacional de Previdência entre Brasil e Portugal que pode fazer com que você consiga sua aposentadoria em dois países.

Desta maneira, você ter duas rendas no mês, uma recebida em real (R$) e uma em euro (€).

Tudo isso é possível graças ao Tratado Internacional realizado entre os dois países.

Quer entender mais como funciona esse Acordo e como fica sua aposentadoria? Pois continue comigo pois você vai entender:

1. O que é o Acordo Internacional de Previdência?

Um Acordo Internacional ocorre quando dois ou mais países acordam sobre determinado assunto, seja para:

  • regular relações comerciais;
  • incentivar a economia entre países;
  • promover a paz;
  • estabelecer regras de migração, entre outros.

O Acordo Internacional também é chamado de Tratado. Com certeza você já deve ter escutado este termo.

Em regra, esse Tratado cria lei entre os países que os assinaram.

Portanto, uma vez assinado o Acordo, os países se comprometem a seguir estritamente o que foi disposto no documento normativo.

Falando agora especificamente do Acordo Internacional de Previdência, temos que dois ou mais países geram direitos e obrigações entre si em tema relacionado à Previdência Social entre os envolvidos.

Como eu disse, o Tratado cria lei entre as partes. Portanto, quem assinou o Tratado Internacional de Previdência deve seguir o que foi acordado.

Cabe dizer que existe o Tratado Bilateral, onde somente dois países assinam o Acordo, e também o Tratado Multilateral, onde participam 3 ou mais países.

países que tem acordo de previdência com o Brasil

Em relação ao Acordo Bilateral, que será objeto deste conteúdo, o Brasil possui Tratados Internacionais de Previdência com os seguintes países:

  • Alemanha;
  • Áustria;
  • Bélgica;
  • Cabo Verde;
  • Canadá e Quebec;
  • Chile;
  • Coreia do Sul;
  • Espanha;
  • Estados Unidos da América;
  • França;
  • Grécia;
  • Israel;
  • Itália;
  • Japão;
  • Luxemburgo;
  • Portugal;
  • Suíça.

Portanto, para cada país citado, existe uma “lei” específica entre eles e o Brasil regulando a Previdência Social quando o brasileiro estiver morando no estrangeiro e vice-versa.

Portanto, uma regra entre o Brasil e Japão pode ser diferente de uma Regra entre o Brasil e Grécia, por exemplo.

2. Acordo Internacional de Previdência entre Brasil e Portugal

Como você deve ter acabado de ver, o Brasil possui um Acordo de Previdência com Portugal.

É sabido que fomos colonizados pelos portugueses. Portanto, o laço cultural e étnico com Portugal é bastante próximo.

É muito comum as pessoas que possuem dupla nacionalidade, geralmente advinda de nossos pais, avós ou bisavós.

Para você ter uma noção, mais de 180 mil brasileiros moram legalmente em Portugal em 2020, podendo ser até o dobro, pois, na pesquisa, não foi considerado os brasileiros que possuem dupla nacionalidade.

Enfim, falei tudo isso para você entender que seria uma consequência lógica haver um Acordo Internacional de Previdência entre o Brasil e Portugal, exatamente por toda essa proximidade que nós temos com os nossos amigos lusitanos.

No Brasil, o Acordo se aplica à legislação sobre o Regime Geral de Seguridade Social relativo à:

Já em Portugal, o Acordo aplica-se:

  • aos regimes de segurança social aplicáveis à generalidade dos trabalhadores por conta de outrem e aos trabalhadores independentes, bem como aos regimes de inscrição facultativa do subsistema previdencial do sistema de segurança social, no que respeita às prestações nas eventualidades de doença, maternidade, paternidade e adoção, doenças profissionais, invalidez, velhice e morte;
  • ao regime não contributivo do subsistema de solidariedade do sistema público de segurança social, no que respeita as prestações nas eventualidades de invalidez, velhice e morte;
  • ao regime aplicável às prestações por encargos familiares do subsistema de proteção familiar do sistema de segurança social;
  • ao regime de proteção social dos funcionários públicos, com exceção da proteção na eventualidade desemprego;
  • ao regime de reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho;
  • ao regime do Serviço Nacional de Saúde.

3. Como funciona a aposentadoria por velhice em Portugal?

regras de aposentadoria por idade e aposentadoria por velhice em Brasil e Portugal

A aposentadoria por velhice é igual a nossa aposentadoria por idade.

O benefício é pago quando se atinge certa idade, somado a um tempo de contribuição mínimo.

Os requisitos para a aposentadoria por velhice dos portugueses são:

Curiosidade: em Portugal, considera-se um ano civil de recolhimento se a pessoa trabalhou por, pelo menos, 120 dias dentro do mesmo ano.

Além disso, não há distinção de requisitos entre os homens e mulheres, como ocorre aqui no Brasil.

A título de comparação, para se aposentar atualmente na Regra de Transição da Aposentadoria por Idade aqui no Brasil, o segurado precisa cumprir:

  • 65 anos de idade (homem) ou 62 anos de idade (mulher);
  • 15 anos de contribuição (homens e mulheres).

4. Como utilizar do Acordo entre Brasil e Portugal para se aposentar?

Provavelmente é o tópico que você estava esperando.

O art. 9 (1) do Decreto 1.457/1995, que promulgou o Acordo de Previdência entre Brasil e Portugal, cita que:

“uma pessoa que haja cumprido períodos de seguro sob a égide das legislações de ambos os Estados Contratantes terá esses períodos totalizados para concessão das prestações decorrentes de invalidez, velhice e morte, exceto quando estiverem satisfeitas as condições estabelecidas por aquela legislação, sem que haja necessidade de recorrer à totalização”.

Resumidamente: o tempo de contribuição realizado no Brasil pode ser levado para contar como tempo de recolhimento lá em Portugal, e vice-versa, para fins de concessão de uma aposentadoria (por idade, contribuição e por incapacidade permanente).

Ou seja, também é possível que um português (ou até mesmo um brasileiro) traga seus recolhimentos de Portugal para contar numa aposentadoria aqui no Brasil.

A exceção ocorre quando a pessoa já preenche os requisitos para uma aposentadoria em algum dos países sem que ela precise do tempo de contribuição do país estrangeiro.

Cabe dizer que o Decreto também considera o tempo dos servidores públicos da União, estados, Distrito Federal e municípios também podem ser levados para Portugal para somar no tempo de recolhimento português.

Exemplo do José

José trabalha como cozinheiro aqui no Brasil há 10 anos, recolhendo normalmente para o INSS como segurado obrigatório.

Acontece que ele conseguiu sua dupla cidadania e mudou-se para Portugal, trabalhando na mesma função por 14 anos.

Quando ele atingir a idade mínima em Portugal, ele somará 24 anos de contribuição, pois ele possui 14 anos de recolhimento no estrangeiro e 10 anos aqui no Brasil.

Em resumo, a possibilidade discutida no tópico anterior é a contagem do tempo recolhido no Brasil e em Portugal.

Atenção: se fosse para José somar o tempo da Aposentadoria por Idade (15 anos de contribuição), ele só iria “pegar” 5 anos do tempo de contribuição de Portugal, pois já tem 10 anos recolhidos aqui no Brasil.

Outro exemplo: um homem que trabalhou durante 8 anos em Portugal e se mudou para o Brasil.

Aqui no Brasil, a pessoa trabalhou por mais 27 anos até que viu que tinha direito a uma das Regras de Transição da Aposentadoria por Tempo de Contribuição.

O homem terá o requisito mínimo, pois tem 35 anos de recolhimento (27 feitos no Brasil e 8 em Portugal).

5. Como conseguir duas aposentadorias?

Lembra que citei lá no início que seria possível ter direito a duas aposentadorias?

Pois é, eu não esqueci, hehe.

Partindo da premissa que agora você sabe da possibilidade de contar o tempo de contribuição realizado em Portugal aqui no Brasil (e vice-versa), fica mais fácil você entender.

Digo isso porque, caso você complete os requisitos para as aposentadorias nos dois países (contado o tempo realizado no Brasil e em Portugal), é possível você requerer a aposentadoria nos dois países.

Por exemplo, você viu que a aposentadoria aqui e em Portugal precisa de, no mínimo, 15 anos de recolhimento, além da idade mínima.

Imagine que trabalhei 7 anos e meio no Brasil e 7 anos e meio em Portugal.

No caso, já somei 15 anos de contribuição nos dois países, pois posso levar o tempo de contribuição aqui no Brasil para Portugal, e o tempo trabalhado lá em Portugal aqui no Brasil.

Portanto, aos olhos da Previdência portuguesa e brasileira, utilizando como fonte o Acordo Internacional de Previdência entre os dois países, já completei o tempo mínimo de contribuição para conseguir a aposentadoria por idade (velhice).

Desta maneira, já posso fazer o requerimento administrativo em ambos os países e começar a ter duas aposentadorias.

Assim, receberei uma aposentadoria aqui no Brasil em real (R$) e uma lá em Portugal em euro (€).

6. Como fazer o pedido de aposentadoria no INSS?

O modo se se pedir uma aposentadoria baseada num Tratado de Previdência Internacional é diferente.

A primeira coisa que você deve fazer é acessar o site do Meu INSS e fazer o login com sua conta gov.br

Após isso, basta clicar em novo pedido, como mostra a imagem abaixo:

novo-pedido-meu-inss

Após isso, basta descer um pouco na página até encontrar “Benefícios e Serviços de Acordos Internacionais“:

acordos-interncionais-meu-inss

Agora, é só escolher o benefício pretendido e seguir as instruções do site.

Lembrando que no Acordo entre Brasil e Portugal é possível pedir:

7. Quanto vou receber de aposentadoria?

Com certeza é algo que você deve ter ficado na dúvida, não é?

Pois então, agora não tenho uma notícia tão boa.

Em resumo, o valor do benefício que utiliza o tempo de contribuição do estrangeiro será proporcional aos valores recolhidos no país em que se requere a aposentadoria.

Esse é o disposto no art. 35, § 1º do Decreto 3.048/1999:

"Art. 35. A renda mensal do benefício de prestação continuada que substituir o salário-de-contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado não terá valor inferior ao do salário mínimo nem superior ao limite máximo do salário-de-contribuição, exceto no caso previsto no art. 45.

§ 1º A renda mensal inicial pro rata dos benefícios por totalização, concedidos com base em acordos internacionais, será proporcional ao tempo de contribuição para previdência social brasileira e poderá ter valor inferior ao do salário-mínimo."

Perceba, ainda, que é explicado que o valor da aposentadoria brasileira poderá ser inferior ao salário-mínimo vigente, algo que é impossível para um benefício recebido com os recolhimentos totalmente feitos aqui no nosso território.

A justificativa disso é bastante simples: estamos falando de dois regimes previdenciários distintos, o brasileiro e o português.

Se o segurado trabalhou nos dois países, ele verteu contribuições para a Seguridade Social do local da prestação de serviços.

Assim, seria estranho pensar que os valores recolhidos do segurado feitos em Portugal fossem repassados para a Previdência brasileira.

Se foi feita a contribuição em um país, o valor fica ali para ser administrado pelo órgão gestor da Previdência Social.

É por isso que quando trazemos o tempo de serviço de Portugal, o que vem é somente o tempo de contribuição e não os valores de recolhimento.

Portanto, o valor da aposentadoria aqui no Brasil e em Portugal será proporcional aos valores recolhidos aqui no Brasil.

Então, quanto maior for seu tempo de contribuição em um dos dois países, maior será o seu benefício.

Seria inviável pensar que alguém que contribuiu por 14 anos em Portugal e 1 ano no Brasil ter uma aposentadoria alta aqui, não é?

Nesse caso, a pessoa conseguirá uma boa aposentadoria em Portugal, pois contribuiu por muito tempo lá.

Exemplo da Joana

Vamos imaginar que Joana possui 10 anos trabalhados no Brasil e 5 anos em Portugal que atingiu os requisitos após a Reforma da Previdência entrar em vigor.

O cálculo para as mulheres leva em conta:

  • a média de todos os recolhimentos da segurada desde julho de 1994, média esta corrigida monetariamente;
    • da média, a segurada recebe 60% + 2% ao ano que exceder 15 anos de recolhimento;
  • no caso dos homens, seria +2% ao ano que excedesse 20 anos de recolhimento.

Vamos pensar que foi feita essa média da segurada e chegou-se no valor de R$ 1.900,00.

A alíquota da segurada será de 60% + 0%, uma vez que não houve nenhum ano de contribuição acima de 15 anos.

Portanto, inicialmente a segurada receberia 60% de R$ 1.900,00 = R$ 1.140,00.

Contudo, devemos olhar a proporção de contribuição feita aqui no Brasil.

Dos 15 anos de contribuição total que a mulher possui, 10 foram feitos aqui no Brasil.

Para fazer essa proporção, matematicamente falando, deve ser multiplicado o valor do cálculo do benefício pela fração de recolhimento.

No caso seria 1.140 x 10/15 (fração esta pois de 15 anos totais, 10 foram feitos aqui no Brasil).

Fazendo a multiplicação, chegamos a R$ 760,00.

Portanto, aqui no Brasil, a segurada receberia R$ 760,00 de aposentadoria.

Além desses R$ 760,00, ela também vai receber o valor proporcional do tempo que contribuiu em Portugal lá na previdência portuguesa, quando fizer o requerimento.

Só que aí o cálculo muda de figura.

E em Portugal, como fica?

O cálculo para a aposentadoria em Portugal é bastante complexo e envolve inúmeros fatores.

Mas, em regra, o é calculado da seguinte maneira:

Valor do benefício = Remuneração de Referência x Fator de Sustentabilidade x Taxa Global de Formação

  • a Remuneração de Referência é calculada pela fórmula: TR / (anos de contribuições x 14);
    • TR é o Total de Remunerações anuais, corrigida monetariamente, de todos os anos
  • Taxa Global e Formação é o número de anos civis de contribuição;
  • Fator de Sustentabilidade é como se fosse o fator previdenciário português. Leva em conta a idade que a pessoa se aposenta e a expectativa de sobrevida.

Conclusão

Através da leitura deste conteúdo, você entendeu melhor como funciona o Acordo Internacional de Previdência entre o Brasil e Portugal.

Você conseguiu perceber como funciona a somatória do tempo de contribuição entre os países, o valor do benefício que pode receber e sobre a possibilidade de ter duas aposentadorias.

Muitas pessoas acham que levando o tempo de contribuição para Portugal (ou vice-versa), perde-se o direito da contribuição onde foram feitos os primeiros recolhimentos, mas isso é um erro.

Como eu expliquei, você tem direito a uma aposentadoria com valores proporcionais ao que você recolheu ao longo da vida.

É um direito seu, então lute até o fim!

E então, gostou do conteúdo? Conhece algum brasileiro que foi pra Portugal e pretende se aposentar logo?

Que tal contar da novidade para essa pessoa? É sempre bom ajudar o próximo.

E para finalizar, deixo aqui dois conteúdos que vão te deixar craque em Aposentadoria no Exterior:

Muito obrigado por ter me acompanhado até aqui no conteúdo.

Um abraço e até a próxima 🙂

ben-hur-cuesta

OAB/PR 92.875
Advogado-Pesquisador em Direito Previdenciário e Mestre em Direito Internacional e Europeu. Apaixonado por Música Popular Brasileira e um bom açaí na tigela.